segunda-feira, 31 de maio de 2010

Café e cigarros


Por agora o Estado ainda não proibiu o consumo de café. Mas não me admira que, nesta vertigem governamental de controlo obsessivo dos vícios privados, um dia chegue a hora em que isso aconteça. O que seria da vida sem café e sem cigarro?
Mesmo para quem não fuma ou não bebe café, aceitará a ideia de que sem estas duas formas de consumo não se teria feito a história da humanidade da mesma forma durante o século XX. Não teria havido vida de café (espaço físico), nem vida boémia e artística. O cigarro e o café são, indubitavelmente, duas formas de prazer do homem e duas manifestações da cultura popular. Alguém imagina Humphrey Bogart sem um cigarro na mão? Ou James Dean? Ou Marlene Dietrich? Ou Mickey Rourke?
E se não fosse pelo cigarro e pelo café, não teria havido este belíssimo filme de Jim Jarmusch à volta de... cigarros e café. “Coffee and Cigarrettes” (2003) é uma espécie de apologia dos dois vícios como exercício de liberdade e de afirmação de um gosto pessoal. Um filme minimalista e pragmático: uma mesa de café, duas personagens, conversa fiada (sobre tudo e sobre nada), e rios de café e nicotina. Com quem? Gente desta craveira: Tom Waits, Iggy Pop, Roberto Benigni, Bill Murray, Steve Buscemi, Steve Coogan e Cate Blanchett. E eu que não fumo (só bebo café) dá-me sempre vontade de saborear uma cigarrada depois de ver o filme.
Post a propósito de hoje ser o Dia Mundial sem Tabaco.

Discos que mudam uma vida - 107


"Underground - Original Soundtrack" (1995) - Goran Bregovic

domingo, 30 de maio de 2010

Como deveria ter acabado o filme

"How It Should Have Ended" é um divertido site que, tal como o nome indica, propõe finais alternativos, em animação, de filmes célebres. Como este, que mistura o filme "Exterminador Implacável" com "Regresso ao Futuro".
Há mais exemplos no site.

sábado, 29 de maio de 2010

Dennis Hopper - RIP

Sobre Dennis Hopper escrevi alguns posts.
Não era um actor genial, não conseguiu ter uma carreira contínua de grandes interpretações, nem alcançou a estatura artística de um Marlon Brando, de um Jack Nicholson ou de um Al Pacino. Mas Dennis Hopper foi, em momentos determinantes do seu percurso, um actor de grande fulgor criativo.
Um actor que conseguiu imprimir um cunho de autêntico culto em alguns filmes chave da história do cinema. Porém, por causa dos excessos que cometeu - drogas, escândalos e alcóol -, a sua carreira foi marcada por um profundo balançar entre o sucesso e o total esquecimento. Devido a esses mesmo excessos, o próprio Dennis Hopper chegou a dizer: "I should have been dead ten times over. I believe in miracles. It’s an absolute miracle that I’m still around.”
Mais do que a sua marca essencial em "Easy Rider" ou "Blue Velvet", recordarei para sempre este actor como o louco fotojornalista em "Apocalypse Now" de Coppola.

"Inception"

Estreia só no dia 22 de Julho em Portugal e é um dos filmes mais aguardados do ano: "Inception" de Christopher Nolan com Leonardo DiCaprio. Um filme sob os labirintos da mente humana e o poder dos sonhos.
Visualmente, o trailer está prodigioso, o elenco é magnífico, o argumento suscita muita curiosidade e Nolan já deu provas do seu estilo de realização com "The Dark Knight".

Perguntas indiscretas - 31


Há espectadores de cinema para todos os gostos.
Mas afinal de contas, qual é o principal motivo que motiva um cinéfilo a escolher um determinado filme em cartaz? O nome sonante do realizador? Os actores? O argumento? A reputação artística ou comercial do filme? Os eventuais prémios recebidos? A banda sonora? A fotografia? Os efeitos especiais revolucionários? O "hype" gerado pela comunicação social?...

sexta-feira, 28 de maio de 2010

Heidegger e um Hipopótamo


"Heidegger e um Hipopótamo Chegam às Portas do Paraíso" de Thomas Cathcart e Daniel Klein, é um livro que, de forma séria mas também divertida, aborda algumas das questões mais prementes da filosofia: morte, justiça, moral, imortalidade, existência de Deus, religião, à luz de filósofos como Schopenhauer, Sartre, Hegel, Kierkegaard ou Heidegger.
Pelo meio contam-se algumas boas piadas que servem também como motivo de reflexão. Gosto das piadas especialmente sádicas que envolvem a morte, como esta:
Médico: "Já tenho o resultado dos seus exames e tenho uma notícia boa e uma má para lhe dar".
Doente: "Diga lá".
Médico: "A boa é que tem apenas 24horas de vida".
Doente: "Essa é a boa?! Então qual é a má?"
Médico: "Esqueci-me de lhe dizer ontem".

quinta-feira, 27 de maio de 2010

Kung fu bizarro


Quentin Tarantino costuma dizer que é um fã dos filmes de kung fu, sobretudo dos filmes de artes marciais de série B e de culto, que pouca gente conhece. Esta filmografia tão especial terá servido de inspiração para o seu díptico "Kill Bill". Por isso me espanta que Tarantino já tenha visto todos os filmes mais estranhos de artes marciais, como os que constam nesta lista.

quarta-feira, 26 de maio de 2010

Louise Brooks - o culto de uma actriz


No dia 8 de Agosto de 1985 morria, na total solidão e indiferença, uma das maiores divas do cinema mudo: Louise Brooks.
Teve uma carreira curta, de pouco mais de 10 anos e participou apenas em 24 filmes, quase todos filmes menores e esquecidos. Menos um, que foi o suficiente para lhe valer o reconhecimento mundial, elevando-a ao património do imaginário cinematográfico de sempre: "A Caixa de Pandora" (1928), do realizador alemão G.W. Pabst (que já tinha lançado Greta Garbo).
Neste filme, Louise Brooks irrompe na tela como um vulcão sensual e interpreta Lulu, uma jovem radiante que é inconscientemente responsável pela ruína dos seus amantes e é vítima da exploração daqueles que se aproveitam de sua beleza e ingenuidade. A actriz empresta à personagem Lulu uma alta carga de erotismo. Um erotismo à flor da pele, insinuante, feito de gestos e olhares (não esqueçamos que se trata de um filme mudo). O rosto e o corpo de Brooks irradiam sensualidade, enlouquecendo os homens à volta (mais do que Marlene Dietrich fez em "O Anjo Azul" de Sternberg).
A beleza expressiva e rara de Louise Brooks e o seu talento para interpretar essa mulher fatal, enigmática e ingénua, sagrou-a para sempre como uma figura de culto que perdura até aos nossos dias. Tal é o culto que existem inúmeras páginas na internet de devoção incondicional a esta actriz e mulher que, após o fim do período mudo, praticamente não voltaria a trabalhar no cinema. A título de exemplo, veja-se este site brasileiro.
Em Portugal existe à venda, na Fnac, uma edição em DVD do filme "A Caixa de Pandora", mas pode ser adquirido uma edição espanhola (a que eu tenho) mesmo aqui, por um preço muito convidativo.

terça-feira, 25 de maio de 2010

Diamanda Galás: Diva Negra


Num mundo conspurcado pelo Mal e polvilhado por interesses demoníacos, cujas manifestações se revelam através da Sida, da morte, do sofrimento ou de genocídios, Diamanda Galás representa uma tentativa de cura libertadora. Uma cura que expurga esses males, uma cura que se materializa numa das vozes mais feéricas e ameaçadoras que alguma vez se ouviu no panorama da música contemporânea.
Numa espécie de reencarnação negra de Maria Callas, num misto de diva vampírica e de profetiza pessimista, Galás faz uso da sua incrível extensão vocal (quatro oitavas) para, simultaneamente, propalar os pecados do homem e denunciar o dogmatismo religioso (assim como a insidiosa moral cristã). Uma voz negra e profundamente pessimista perante a condição do humano.
Nascida em San Diego, sob o sol escaldante da Califórnia, esta descendente de pais gregos ortodoxos revelou-se, nos últimos 20 anos, como a porta-voz de uma mensagem apocalíptica sobre as múltiplas faces da angústia existencial do homem. Com formação musical clássica (é pianista de eleição), fluente em várias línguas, detentora de uma cultura universalista, imbuída da poesia maldita de Baudelaire, fascinada pelo lado espectral da vida humana e recorrendo a textos bíblicos e de outras culturas não ocidentais, Diamanda Galás percorreu nos seus discos, um caminho tortuoso de purificação espiritual, de penitência árdua e sem concessões, rumo à catarse suprema.

Galás é provocadora, insubmissa, controversa, radical, experimentalista, audaz, mordaz, como ficou demonstrado em álbuns demenciais como “Litanies Of Satan” (1982), “Divine Punishment” (1986) ou “Plague Mass” (1991). Bastariam estes três tremendos testamentos sonoros para perpetuar o nome de Galás nos anais da história da música, fruto da sua voz visceral capaz de exorcizar demónios e da sua criatividade pianística que está tão à vontade no blues como nos devaneios libertinos.
Após o seu último registo ao vivo, “Malediction And Prayer”, datado de 1998, Diamanda Galás lançou edições sucessivas: “La Serpenta Canta”, editado no final de 2003, e “Defixiones: Will And Testament, Orders From The Dead”, lançado em Janeiro de 2004, ambos discos duplos, a solo e ao vivo. Dois trabalhos que, apesar de distintos esteticamente, acabam por se complementar. “La Serpenta Canta” é um registo gravado ao vivo em Adelaide, Austrália, em 2001; trata-se, muito prosaicamente, de um recital de canções em que Diamanda Galás interpreta, acompanhada apenas pelo piano, standards de canções blues e soul de autores populares como Hank Williams, Ornette Coleman, Screamin’ Jay Hawkins ou The Supremes. Neste disco, Galás consegue a proeza de reinventar o espírito soul-jazz de temas clássicos como “My World Is Empty Without You”, “I Put a Spell On You” ou “Baby’s Insane”.

A cantora, respeitando as formas musicais dos originais, reorganiza-as harmonicamente, dando-lhes uma outra frescura tímbrica e, em suma, outra realidade sonora. “La Serpenta Canta” resulta, deste modo, como um dos trabalhos mais acessíveis e luminosos da autora de “Vena Cava”, onde até o formato canção é minimamente reverenciado. Com “Defixiones: Will And Testament, Orders From The Dead”, a história é já outra, bem mais complexa, lírica e musicalmente. Este trabalho é remanescente da obra musical de Galás referente aos anos 80, isto é, à sua fase mais experimental e vocacionada para a exploração de uma temática específica. Da mesma forma que “Plague Mass” versava sobre as vítimas da Sida, este disco evoca o genocídio arménio e grego perpetrado pelo exército turco entre 1914 e 1923. Ou seja, novamente a veiculação de uma mensagem política incontestavelmente forte.
Diamanda Galás socorre-se de poemas e textos históricos arménios, gregos, espanhóis e hebraicos sobre o tema, colocando o dedo na ferida aberta que constituem, ainda hoje, estas atrocidades cometidas há um século atrás. A cantora e pianista aborda o assunto sem constrangimentos e pudores, salientando o sofrimento e a morte que tais acontecimentos representaram para todo um povo massacrado. Musicalmente, “Defixiones: Will And Testament, Orders From The Dead”, caracteriza-se por ser o regresso às sonoridades ríspidas e cáusticas do início da carreira de Galás, misturando melodias religiosas com a voz poderosa e extrema, despoletando as emoções mais primárias de quem ouve tais cerimoniais de morte e estertor. Pelo meio da sua carreira Galás teve tempo de encetar uma notável experiência no rock mais convencional, com John Paul Jones, baixista dos Led Zeppelin, no álbum "This Sporting Life" de 1994. 2008 viria ao mundo "Gulity Guilty Guilty", um disco registado ao vivo com alguns momentos musicais de intensidade emocional arrebatadora.
No fundo, a música de Galás é um exigente testamento que serve para agraciar a alma de quem morreu. Como, por exemplo, a alma do irmão da cantora que morreu de Sida e, em última instância, a alma de todos nós que vamos morrer um dia
Diamanda Galás e John Paul Jones:


Diamanda Galás ao piano num clássico do blues:

Um clube de vídeo e um quiosque


Ao passear pelo centro da minha cidade apercebi-me da quantidade de lojas comerciais fechadas. Espaços e mais espaços que outrora eram comércio vivo, agora estão votados ao abandono, tornando a cidade mais moribunda e menos dinâmica.
De todas as lojas fechadas, houve duas que me sensibilizaram particularmente: um quiosque de jornais e um clube de vídeo. Ambos já existiam há muitos anos (mais de 20), e foram, para muita gente, fonte de conhecimento, saber e informação.
Era o meu caso. Naquele clube de vídeo aluguei grandes filmes (ainda em formato VHS), depois em DVD, guardando muitas memórias cinéfilas gratificantes. Apesar de já quase não o visitar, foi com alguma consternação que me deparei com o seu encerramento. O encerramento daquele clube de vídeo representa, para mim e de forma simbólica, o fim de uma era de fruição cinéfila.
Já o fecho do quiosque representa algo semelhante: por lá gastei pequenas fortunas em revistas portuguesas e estrangeiras, jornais e colecções. Por lá comprei as primeiras edições do semanário Blitz, do Independente, da revista Kapa, do Se7e, do Expresso, Melody Maker, do New Musical Express, da Premiere, da Cahiers du Cinéma, entre muitas outras publicações que ajudaram à consolidação da minha formação cultural ao longo dos anos. É também um pedaço de vida que morre com o fecho deste quiosque. Parece simples: um clube de vídeo e um quiosque. Coisa pouca nos tempos que correm, mas que tanto significado tiveram para mim.
E eu bem sei que daqui a uns anos, clubes de vídeo serão coisa do passado, e quiosques terão cada vez menos atractivos para as novas gerações. Alguém falou em Internet? Sim, mas ela não explica tudo...
PS - Já escrevi aqui sobre o fim previsível dos clubes de vídeo (neste caso, da cadeia Blockbuster).

segunda-feira, 24 de maio de 2010

Discos que mudam uma vida - 106


Wim Mertens - "Maximizing the Audience" (1985)
Houve uma altura na minha aprendizagem/formação musical que me deixei fascinar pela música minimal repetitiva: Philip Glass, Steve Reich, Terry Riley, John Adams... Gostava do exotismo desta corrente musical, da relevância dada ao ritmo e à "repetitivadade do prazer", como dizia Glass.
Só mais tarde conheci o trabalho de Wim Mertens, a par de Michael Nyman, o discípulo europeu da estética minimalista. Mas o minimalismo de Mertens era diferente. Tinha uma abordagem mais ecléctica, mais expressiva e melódica. Juntamente com "Struggle for Pleasure" (1983), este "Maximizing the Audience" é a obra-prima de Mertens.

Faz hoje 30 anos que o mundo viu este filme pela primeira vez







domingo, 23 de maio de 2010

Woody Allen e a velhice


"A minha opinião sobre a morte continua a mesma: sou completamente contra. Se conseguisse estar em forma como Manoel de Oliveira, gostaria de ser centenário. Mas envelhecer não traz quaisquer vantagens. Não ficamos mais inteligentes nem mais generosos. Aceitem o meu conselho: evitem envelhecer".
Woody Allen em declarações no Festival de Cannes

sábado, 22 de maio de 2010

Um filme para os tempos de hoje


Vivemos um tempo histórico que parece manipulado e dirigido pelos grandes grupos de interesses (económicos, políticos, culturais...) à escala global. Um tempo de profundo descrédito das instituições que julgamos defenderem os interesses da sociedade. Um tempo de paranóia informativa, de puro desnorte de valores válidos. Estes pensamentos trouxeram-me à memória um filme. Um filme que, de forma arrasadora, aborda todos estes assuntos.
Falo de "Bug", do realizador William Friedkin, película que passou ao lado de muita gente quando estreou em Portugal, em Julho de 2007 (o Verão não é altura propícia para se dar atenção a este tipo de filmes).
Do mesmo realizador do essencial thriller dos anos 70 "Os Incorruptíveis Contra a Droga" (1971) e um dos mais assustadores filmes de terror de sempre, "O Exorcista" (1973), "Bug" é um filme-catarse dos traumas reminiscentes do pós-11 de Setembro. Um filme sobre as conspirações do Estado sobre o indivíduo, sobre a crescente loucura que se apodera do homem quando este se sente ameaçado pelo medo e pelo desespero.
A história decorre numa contenção rara de recursos - um cenário de hotel decrépito e 4 personagens - o argumento é baseado numa peça de teatro de sucesso.
Paranóia, viagem aos abismos negros dos fantasmas interiores, claustrofobia psicológica, metáfora política em jeito de pesadelo kafkiano num filme portentoso capaz de colocar em causa toda a ideia de segurança humana, social e política contemporânea.
Um filme cada vez mais actual para a sociedade em que vivemos.

Tom Waits e a MOJO


A revista MOJO celebra, em Julho, a edição nº 200. Por ser um número especial, convidou, nada mais nada menos do que Tom Waits para editar a revista. Esta edição especialíssima vai ser acompanhada por um CD com músicas escolhidas por Waits e artigos exclusivos.
Certamente que estará à venda nos quiosques portugueses dentro de pouco tempo.

O tributo a Ian Curtis

O último número do New Musical Express tem na capa Ian Curtis.
Para além disto, no respectivo site multiplicaram-se iniciativas, ao longo desta semana, para assinalar os 30 anos do desaparecimento do líder dos Joy Division.
Neste link, podem ver-se 14 fotografias pouco conhecidas (como esta a cores) de Ian Curtis, assim como outros tantos testemunhos - em jeito de tributo - de músicos famosos sobre o que tornava tão especial o letrista e vocalista dos Joy Division.

"I started a Joy Division covers band when I was 17 - I really do think he's the greatest lyricist rock has ever seen." - Moby
"The work that he left behind really had the ability to touch your heart. That's soemthing that nobody can take away from him. It's timeless." - Brandon Flowers, The Killers

quinta-feira, 20 de maio de 2010

Momentos e Imagens - 65

Fotografia histórica que marcou uma fase decisiva de dois jovens artistas no ano de 1976: Philip Glass (compositor e músico) e Robert Wilson (encenador, coreógrafo, performer - trabalhou com William S. Burroughs, Allen Ginsberg, Tom Waits e David Byrne).
Glass e Wilson trabalhavam na altura na ambiciosa ópera-que-revolucionou-a-ópera "Einstein on the Beach", na qual o compositor norte-americano revelou, em todo o esplendor estético, a sua inovadora música minimal-repetitiva.
Não menos importante: a fotografia foi tirada por um dos mais importantes fotógrafos americanos dos anos 70 e 80: Robert Mapplethorpe

A pior sequela de sempre?


Há listas de filmes verdadeiramente surpreendentes. Diria mais: listas quase patéticas. Nesta lista procura-se saber quais as piores sequelas jamais realizadas. Interessante proposta. A lista começa numa contagem decrescente (10 para 1). Começo a ver os títulos obviamente dispensáveis: "American Pie", "Batman and Robin", "Crank 2: High Voltage" e outras sequelas igualmente medíocres. Eis quando, finalmente levo o cursor do rato até ao 1º lugar da lista (supostamente a "pior sequela de sempre") e constato que é... "O Padrinho III" de Francis Ford Coppola!
E qual o argumento invocado? Apenas um: Sofia Coppola (e por acréscimo, George Hamilton, que substituiu Robert Duvall). Claro que a filha do realizador teve uma má prestação (a primeira da sua vida) no filme, mas é razão suficiente para classificar negativamente a terceira parte da saga da família Corleone. Claro que não. Apesar de "O Padrinho III" ser o filme mais fraco da trilogia de Coppola, mantém, ainda assim, grandes atributos e fecha, com chave de ouro, a trilogia. E nem o óbvio erro de casting de Sofia Coppola mancha a qualidade do filme (e é até infame ver este título de Coppola misturado com sub-produtos comerciais como "American Pie").

quarta-feira, 19 de maio de 2010

Mobília humana

É uma ideia que um qualquer artista surrealista não desdenharia: uma estante de livros feita de corpos humanos. Corpos vivos e quentes, mas hirtos e imóveis como estátuas.
Desvarios simbolistas à parte, a verdade é que se trata de uma construção visual magnífica da série "Human Furniture" do fotógrafo espanhol David Blázquez.
[clicar para melhor resolução]

terça-feira, 18 de maio de 2010

Dissecar "Control"


Quando revi em DVD os extras do filme "Control" de Anton Corbijn, fiquei a conhecer inúmeros pormenores e curiosidades em relação aos Joy Divison, a Ian Curtis e à concepção do próprio argumento e filme:
- Sam Riley (que interpreta Ian Curtis) passou várias noites em clínicas de cura de epilepsia para melhor compreender os sintomas e detalhes da doença.

- A cena final de Deborah Curtis (a actriz Samantha Morton) a gritar desesperadamente na rua quando se apercebe do suicídio de Ian, foi uma das primeiras cenas a ser filmadas. Corbijn revela que Samantha Morton revelou grande domínio emocional para interpretar esta difícil cena logo no início das filmagens.

- A maior parte dos figurantes que constituem a assistência dos concertos dos Joy Division são verdadeiros fãs actuais do grupo, recrutados pelo realizador em vários sites de devoção à banda de Ian Curtis. Este facto tornou mais exigente a interpretação de Sam Riley, uma vez que os figurantes eram verdadeiros fãs do grupo e não meros figurantes.

- Numa das cenas finais de um concerto dos Joy Division (quando interpretam a canção "DeadSouls"), vê-se na primeira fila do público a filha de Ian Curtis, Natalie Curtis, vestida de punk, numa simbólica homenagem ao pai.

- O filme foi filmado em película a cores e só depois transferido para preto e branco em formato 35m, uma vez que o preto e branco inicial tornava-se demasiado granulado.

- Devido à formação de fotógrafo de Anton Corbijn, o próprio assume que o filme parece mais como uma sequência de fotografias do que propriamente uma montagem de planos em movimento (há de facto uma grande predominância de planos fixos).

- As cenas do interior da casa de Ian e Deborah foram filmados em estúdio devido à exiguidade da verdadeira casa, na Barton Street de Macclesfielfd.

- Os actores que interpretam os vários elementos da banda aprenderam a tocar os instrumentos em apenas 2 meses (só o actor Joe Henderson sabia tocar guitarra, mas ainda assim teve de aprender a tocar baixo para encarnar Peter Hook).

- A guitarra eléctrica branca que Sam Riley segura aquando da filmagem do videoclip "Love Will Tear Us Apart" é a mesma guitarra que Ian Curtis tocou no videoclip original.

- As letras do genérico do filme piscam (como uma lâmpada fraca a ascender aos soluços). A ideia foi criar uma analogia com os sintomas da epilepsia.

- Não se vê no filme (sente-se, porém), mas Ian Curtis teve um ataque de choro compulsivo logo após o nascimento da sua filha Natalie - acontecimento que viria a agravar a sua depressão.

- A namorada de Tony Wilson que surge no filme é Gillian Gilbert, mais tarde teclista dos New Order. No filme é interpretada pela gerente da empresa de Anton Corbijn.

- Anton Corbijn assistiu na realidade a um dos ataques de epilepsia de Ian Curtis e foi o fotógrafo que documentou o videoclip "Love Will Tear us Apart".

- O realizador refere que foi ele quem escolheu as canções dos Joy Division no filme. A mítica canção "Love Will Tear us Apart" ouve-se em "Control" quando surgem os primeiros sinais de ruptura entre Ian e Deborah. Corbijn menciona que é uma canção óbvia para essa situação, mas também o seria para qualquer outra, uma vez que o filme aborda, essencialmente, o tema do amor e da sua degenerescência (pessoalmente concordo com a opção).

- Os três músicos dos actuais New Order (Hook, Moris, Summer) praticamente não contribuíram em nada para o filme e nem se encontraram com os actores que os interpretam. No entanto, gostaram muito do resultado final.

- Apesar de ser moda no final dos ano 70 a colocação de posters e cartazes nas paredes dos quartos, a dado momento, Ian Curtis tirou todos os posters dos seus ídolos (Jim Morrison, Iggy Pop, David Bowie) e pintou as paredes com um azul celeste.

- O fumo negro a sair da chaminé do crematório do cemitério foi colocado digitalmente.

- O argumentista de "Control" encontrou-se durante um dia com a amante de Curtis, a belga Annick Honoré, para recolher informação para o filme.

- Grande parte das filmagens foram realizadas na cidade de Nottingham, uma vez que se parece mais com a Manchester do final dos anos 70 do que a Manchester actual.

- As actrizes Samantha Morton (Deborah Curtis) e Alexandra Maria Lara (Annick Honoré) foram as únicas actrizes que nunca se encontraram nas filmagens.

- Segundo Corbijn, Ian Curtis nunca revelou claramente para onde pendia a sua relação amorosa. Na verdade, quer Deborah quer Honoré, ambas reclamam a paixão que Ian nutria por elas.

- Apesar de Ian Curtis ter mantido uma relação amorosa com Annick Honoré, esta afirmou ao argumentista do filme que nunca tiveram relações sexuais.

- Apesar de ter sido um filme com baixo orçamento e sobre um músico que se suicida de um grupo como os Joy Division, Anton Corbijn revela que nunca imaginou que "Control" viria a ser um sucesso de público e de crítica.

Ian Curtis - A minha experiência


Lembro-me como se fosse hoje: o bloco de gelo que se abateu sobre mim com a audição de “Unknown Pleasures”. A minha formação de ouvinte tivera vários estágios, mas nada me tinha preparado para o embate que foi a audição do primeiro disco dos Joy Division. Quando somos adolescentes julgamos que temos o tempo todo do mundo para desfrutar das grandes descobertas musicais. E, na verdade, eu tinha esse tempo todo. Viver em casa dos pais, fechado num quarto hermético, com centenas de discos, cassetes, livros e posters, era mundo suficiente para mim. Claro, a vida de estudante também se fazia, suportada à custa de muita condescendência e resignação.

Daí que, com 15 ou 16 anos, ouvir música significava um refúgio tão revigorante e enérgico como julgo já não existir hoje. Representava marcar um território delimitado à base da militância severa do prazer estético partilhado com um círculo restrito de amigos.
A descoberta da figura de Ian Curtis, mais do que a de Jim Morrisson, Iggy Pop, Lou Reed, David Bowie ou Peter Murphy, foi uma descoberta quase de cariz religiosa. Lia aqueles artigos incensados e devotos do Miguel Esteves Cardoso sobre a intensa e criativa movida de Manchester e fiquei, automaticamente, siderado. Ansioso por conhecer, numa era em que Internet nem figurava nos livros de ficção científica.

Porém, a devoção pelo prazer da descoberta levou-me a mover mundos e fundos, até conseguir pôr os ouvidos na música de Ian Curtis. Primeiro com a banda Warsaw, ainda reminiscente da fúria punk; depois, sim, com a era estilizada, superlativamente estética, de “Unknown Pleasures” e, postumamente à morte de Curtis, com o legado “Closer”. Para um adolescente como eu, de temperamento algo sorumbático e reflexivo, a música dos Joy Division revelou-se como a suprema bênção identitária. Nenhuma outra música, nenhumas outras letras, nenhum outro disco se poderia colar melhor à minha alma do que aqueles discos.
A poesia (porque de poesia se trata) de Ian Curtis resultava numa espécie de elegia sobre a presença terrena desta vida.

E tocava-me nas mais profundas das vísceras (porque a poesia não toca apenas na alma). Via Curtis como um criador ambicioso mas permanentemente insatisfeito, um angustiado feliz que tentava libertar os seus demónios interiores. Gostava das preocupações existenciais de Ian, devedoras das suas leituras de Kerouac, Burroughs, Ballard ou Camus. Cantava o sonho e o pesadelo, o amor e a morte, o desejo de existir e o medo de existir. Comprei um livro com as letras das canções, e li-as uma e outra vez, até sugar toda a essência daquelas palavras (decorava, na íntegra, algumas letras). E ouvia repetidamente, obsessivamente, algumas das canções. A agulha do gira-discos pousava, uma e outra vez, nas mesmas faixas dos vinis: “Isolation”, “Passover”, “Heart and Soul”, “A Means to na End”, “Disorder”, “Shadowplay”, etc.
E foi “Closer”, mais do que “Unknown Pleasures”, a deixar-me incondicionalmente devoto dos Joy Division. Tamanha devoção deveu-se, igualmente, à icónica arte gráfica de Peter Saville expressa na capa e no design, na produção inovadora de Martin Hannett, que concebeu aquela sonoridade única do disco, com a voz intensa e enxuta de Curtis, a bateria marcial de Stephen Morris, o baixo-tocado-como-uma-guitarra de Peter Hook, e a guitarra assanhada de Bernard Summer. Só mais tarde conheceria os tema-hinos, “Atmosphere” e “Love Will Tear us Apart”.
Ian Curtis só podia ter-se transformado em mártir do rock. Não havia outra solução. Como dizia Albert Camus, o suicídio é o único problema filosófico importante – saber se a vida merece ou não ser vivida. Curtis viveu intensamente e sempre no fio da navalha das emoções. O seu derradeiro acto foi o consumar de um fogo que tinha dentro de si. Lembro-me de que, no dia 18 de Maio de cada ano, sentia uma espécie de respeito e reverência espiritual para com a alma dos Joy Division. Era um dia especial.
E lembro-me de comemorar, com um amigo, os dez anos desse dia fatídico (Maio de 1990). Agora assinalam-se já 30 anos, e a intensidade passional continua viva, ainda que algo indolente pela natural passagem do tempo. E os sonhos continuam vívidos, imersos numa realidade ainda por revelar, como se expressa na canção “Dead Souls”: “Someone Take These Dreams Away / That Point me To Another Day / A Duel of Personalities / That Strech all True Realities”.

30 anos: Heart and Soul


Ian Kevin Curtis (15 Julho 1956 18 Maio 1980)

segunda-feira, 17 de maio de 2010

Imagens da Steadycam


O que mostra esta imagem? A sequência da fuga na neve do filme "The Shining" de Stanley Kubrick filmada por um operador de câmara muito especial, com uma câmara pendurada à cintura. É simplesmente um dos operadores de câmara mais famosos e importantes de sempre: Garrett Brown, de seu nome.
É famoso e importante por dois motivos (entre outros): inventou a Steadycam e foi o grande responsável pela revolução na arte de filmar no filme "The Shining" (1980) de Kubrick. Já tinha havido anteriores experiências com a Steadycam, mas foi com o filme de Kubrick que a técnica de filmar com este tipo de câmara se desenvolveu e se impôs no mundo do cinema, sobretudo como um recurso estético e visual (sob a supervisão artística de Kubrick).
Basicamente, a Steadycam é um tipo de câmara que possui um sistema que se acopla ao próprio corpo (geralmente à cintura e de forma segura ou noutro sistema fixo) do operador de câmara, permitindo captar imagens em movimento e muito próximo da acção.
O resultado das imagens captadas por Garrett Brown são sequências de grande efeito visual, como são algumas cenas inesquecíveis de Danny a percorrer o Hotel Overlook no triciclo, ou a perseguição final no labirinto coberto de neve.
Depois desta obra de Kubrick, a utilização da Steadycam vulgarizou-se, mas nunca ninguém conseguiu superar a mestria técnica deste filme (tirando a experiência extrema do filme "A Arca Russa" de Sokurov, integralmente filmado recorrendo a esta câmara).

domingo, 16 de maio de 2010

Discos que mudam uma vida - 105


New Order - "Power, Corruption & Lies" (1983)

Uma capa... bestial

Na história das piores capas de discos de sempre gosto especialmente desta:

É apenas um das muitas preciosidades estéticas expostas neste site. E proponho um exercício: a partir de cada capa, tentem imaginar a que tipo de música corresponde.

sábado, 15 de maio de 2010

Woody Allen e a ditadura


Até parece que o realizador Woody Allen ouviu uma célebre declaração da então presidente do PSD, Manuela Ferreira Leite, quando esta disse que gostava que se suspendesse em Portugal a democracia durante 6 meses para implementar uma ditadura, de forma a levar a cabo uma série de medidas para desenvolver o país.
É que Woody Allen fez uma declaração, no festival de Cannes, muito parecida com a de Manuela Ferreira Leite: "Acho que seria bom para Barack Obama que houvesse uma ditadura durante uns quantos anos na América, para poder fazer uma grande quantidade de coisas boas rapidamente".
Só faço um comentário: nunca pensei que Woody Allen pudesse proferir uma opinião deste teor, e nem acho que tenha havido alguma conotação irónica ou cómica (como é habitual em Woody) nesta afirmação...
(Ah, Woody Allen disse outra coisa importante: que não lhe interessa filmar em 3D, porque o 3D só faz sentido se for para filmar qualquer coisa da Playboy!).

Perguntas indiscretas - 30

Qualquer cinéfilo sente o especial prazer, de quando em vez, de visionar várias vezes um filme que já viu vezes sem conta. Um filme que é da sua particular predilecção, que não se importa de rever em DVD, não o perde numa sala de cinema, nem se recusa de rever num qualquer canal televisivo por cabo.
No entanto, também existe o oposto: filmes que são vemos uma única vez e juramos que nunca mais lhe pomos a vista em cima. Por serem tão maus, por não corresponderem aos nossos gostos ou por causarem irritação espontânea.
Assim sendo, que filme nunca mais querem ver na vida, nem por um segundo?

sexta-feira, 14 de maio de 2010

Os veteranos em Cannes


O Festival de Cannes pode ser uma rampa de lançamento para novos valores do cinema mundial, como aconteceu com o reconhecimento do jovem João Salaviza no ano transacto. Mas Cannes continua, por assim dizer, a ser um espaço de interminável valorização dos realizadores mais veteranos e reincidentes.
Senão vejamos as idades de alguns cineastas presentes este ano em Cannes com filmes:

- Manoel de Oliveira: 101 anos
- Ridley Scott: 73 anos
- Jean-Luc Godard: 79 anos (na imagem)
- Woody Allen: 74 anos
- Abbas Kiarostami: 69 anos
- Stephen Frears: 69 anos
- Otar Iosseliani: 66 anos
- Mike Leigh: 64 anos
- Nikita Mikhalkov: 64 anos
- Oliver Stone: 63 anos

quinta-feira, 13 de maio de 2010

O dinheiro para o cinema de Oliveira


O filme "O Estranho Caso de Angélica" de Manoel de Oliveira foi apresentado hoje no festival de Cannes e, pelas primeiras reacções críticas, foi muito bem recebido. Ainda bem.
A Ministra da Cultura, Gabriela Canavilhas, esteve presente na estreia e referiu que gostou muito do filme, mas gostou ainda mais da música - Chopin interpretado pela pianista Maria João Pires. Não admira esta predilecção, considerando que Canavilhas tem formação musical académica. Mencionou, igualmente, que o Ministério que tutela apoiou o filme de Oliveira com 700 mil euros, num orçamento total que rondou os 2 milhões de euros (co-financiamento oriundo de França e Espanha).
Nesta coisa dos orçamentos para o cinema português não percebo como Pedro Costa - entre outros cineastas portugueses - conseguem fazer grandes filmes com (apenas) algumas dezenas de milhares de euros, quase sem apoios institucionais, comparativamente com Manoel de Oliveira que precisa, em média, um milhão de euros (o último custou dois) para cada novo projecto.
Tanto dinheiro que, à primeira vista, não se vislumbra onde e como é gasto. Dois milhões de euros para a produção? Para a contratação do elenco artístico e técnico? Para a publicidade? Claro que dois milhões de euros, à escala da produção cinematográfica europeia ou americana, é muito pouco. Mas considerando a pequenez do mercado de Portugal e os meios de produção existentes, acho que dois milhões de euros para um filme - mesmo tratando-se de Manoel de Oliveira - é muito dinheiro.

As últimas notas de Mozart


"Amadeus" (1984) é uma obra-prima de Milos Forman. Não é só pelo facto de ter ganho 8 Óscares. Podia não ter ganho nenhum. Porque "Amadeus" é, provavelmente, o melhor filme que já se fez sobre um compositor e a sua obra.
Forman construiu uma verdadeira sinfonia cinematográfica, com total rigor na encenação, na interpretação dos actores (espantosos Tom Hulce como Mozart e F. Murray Abraham como Salieri), na montagem, na progressão dramática da história.
Sabe-se, porém, que nem todos os acontecimentos relatados nesta visão sobre a vida de Mozart são verídicos. Alguns elementos fantasiosos foram explorados, como a natureza da própria relação entre Mozart e Salieri (não foi este que matou o famoso compositor, ao contrário perpassa no filme).
"Amadeus" contém muitas cenas de enorme brilhantismo e intensidade. A música do genial Mozart escorre pelo ecrã como cascata de puro deleite auditivo. Há uma sequência de que gosto particularmente: aquela que diz respeito aos últimos dias de vida do compositor austríaco, quando foi obrigado, por razões financeiras, a compor a sua última e derradeira obra - "Requiem".
Mozart, deitado na cama, exausto, febril e doente, dita uma secção musical importante do "Requiem" a Salieri, o "Confutatis". Tom Hulce é brilhante na forma como encarna um Mozart quase moribundo mas ainda com surpreendente energia criativa. Mozart dita, de cabeça, a melodia e a harmonia a Salieri, que a transcreve para a partitura com tocante entusiasmo. É um processo de ensino-aprendizagem, de transmissão de saberes do mestre para o aprendiz.
A forma como o realizador Milos Forman encenou todo este processo, a forma como, a partir de um determinado momento, a música surge a acompanhar o pensamento de Mozart, a forma como os dois actores (sobretudo Tom Hulce) agarram o espírito das últimas notas musicais criadas por Mozart, revelam a essência genial deste filme.

Momentos e Imagens - 64


Cena doméstica de duas estrelas de Hollywood: Humphrey Bogart a ler com o filho Stephen, enquanto a mulher e actriz Lauren Bacall observa e os três cães dormem.

quarta-feira, 12 de maio de 2010

Headphones all the time anytime


Há uns dias entrei num elevador com um jovem que ouvia música com auscultadores (leitor de mp3). Usava uns auscultadores do tipo iPod, brancos e pequenos, ainda que agora esteja na moda os headphones grandes e vistosos (como na imagem).
Pelo silêncio proporcionado pelo isolamento acústico do elevador, eu próprio conseguia ouvir o que o jovem ouvia. Qualquer coisa de música rock. Fosse o que fosse, apercebi-me que o volume de som estava altíssimo. Decibéis a mais, portanto. O dito jovem não conseguiria ouvir um trovão a dois metros, dado o volume exagerado. Estudos científicos recorrentes comprovam a relação entre a perda de audição progressiva (até 70%) com a utilização desproporcionada de volumes de som nos auscultadores. Os jovens (e menos jovens) só se apercebem desta perda de audição tarde demais...
Perdas de audição à parte, este é um sintoma de que cada vez mais os jovens ouvem música em todas as circunstâncias e mais alguma e a qualquer hora: na rua, a andar de bicicleta, nos consultórios médicos, nas salas de aula, na igreja, em espectáculos de música, em qualquer lugar e a qualquer momento.
Os tempos mudaram drasticamente. Já não existem grupos de jovens que se juntam no isolamento de um quarto para, em conjunto, ouvirem um disco, desfrutando do momento colectivo da descoberta musical. Muito menos existe o culto da iconografia relacionada com o formato CD ou vinil (capas, contracapas, conteúdo informativo, imagens...).
O que existe agora é o consumo musical cada vez mais individualista e imediatista, ao ponto de vários jovens poderem estar na mesma sala a ouvir músicas diferentes, sem comunicação. É mais democrático e acessível, é mais fashion e mais de acordo com as regras da cultura pop, mas neste fenómeno de fruição perdem-se vivências e perde-se o prazer da partilha em comum. Para cada nova geração, novas fórmulas de fruição musical. Até ao dia em que essas gerações só conheçam o mundo virtual onde a desmaterialização da música impera. Para o bem e para o mal.

terça-feira, 11 de maio de 2010

O sagrado nos Monty Python

Um católico explica às dezenas dos seus filhos porque é forçado a doá-los para experiências científicas... Como o Vaticano proíbe os métodos anticoncepcionais, o pai ficou sem dinheiro para sustentar a interminável prole. E Deus fica irado por todo e qualquer esperma desperdiçado...

Vestir Joy Division

Propostas de t-shirts para lembrar, durante este mês, o 30º aniversário do desaparecimento de Ian Curtis.




Vinho ao sabor da música


Nunca fui um grande apreciador de vinhos, mas esta notícia não deixa de me interessar: um grupo de psicólogos da Universidade Heriot Watt, em Edimburgo, realizou uma pesquisa, envolvendo 250 estudantes, que demonstra uma ligação entre a música que se está a ouvir e o sabor do vinho que se está a beber.
De acordo com o estudo desenvolvido, os especialistas concluíram que um copo de "cabernet" saboreado ao som de música mais pesada, fazia o consumidor descrevê-lo como mais "poderoso, rico e robusto", em 60 por cento das ocasiões, do que se o provasse em silêncio. Os mesmos investigadores chegaram a outra conclusão curiosa: o sabor do vinho tipo "cabernet" é mais afectado por músicas pesadas, enquanto o vinho "chardonnay" tem a percepção modificada por "batidas energéticos ritmadas".
Durante um dos testes, foram tocadas quatro músicas diferentes para os mesmos vinhos: "Carmina Burana" de Carl Orff ("poderosa e pesada"); "Valsa das Flores", de Tchaikovsky ("subtil e refinada"); "Just Can`t Get Enough", dos Nouvelle Vague ("energética e refrescante") e, por fim, "Slow Breakdown", de Michael Brook ("melosa e leve"). Ao som de "Just Can`t Get Enough", dos Nouvelle Vague, o vinho branco foi considerado, em mais de 40 por cento, "energético e refrescante". Já ao som de "Slow Breakdown", de Michael Brook, apenas 26 por cento o considerou "meloso e leve". Por seu lado, o vinho tinto teve uma variação de 60 por cento do sabor quando acompanhado por Carmina Burana.
Adrian North foi o professor que liderou o estudo e, depois destes resultados, acredita que os produtores de vinhos podem e devem começar a imprimir recomendações musicais nos rótulos dos vinhos.
Agora só faltam estudos que comprovem a relação entre o consumo de tremoços e a música de Quim Barreiros.

segunda-feira, 10 de maio de 2010

"Happy Birthday Adolf Hitler!"


Ontem assinalou-se a data da derrota oficial da Alemanha nazi na Segunda Guerra Mundial. 65 anos depois, parece que a memória histórica se esvai na sociedade actual. Supostamente, o nazismo foi um dos piores pesadelos da Humanidade, mas ainda há quem se esforce para o manter bem vivo...
Veja-se este caso: um jovem casal holandês, Heath e Deborah Campbell, tem três filhos. Tudo de normal até agora. O elemento que distorce esta aparente anormalidade é o facto de Heath Campbell ser um acérrimo... neo-nazi. Ora, como bom neo-nazi que é, Heath nega a existência do Holocausto, odeia de morte os Judeus e venera o fascismo alemão até às últimas consequências. Para provar o seu amor pela causa, resolveu baptizar os seus três filhos com nomes de acordo com a ideologia que idolatra. Então é assim: uma filha chama-se JoyceLynn Aryan Nation Campbell; a outra, Honszlynn Himler Campbell. E, crème de la crème, o filho mais novo, que acaba de fazer três anos, dá pelo singelo nome de Adolf Hitler Campbell! E logo com uma carinha de anjo (na imagem com os pais).
Ao que parece, o diligente neo-nazi ficou indignado pelo facto de uma pastelaria se ter recusado a confeccionar um bolo de aniversário para o filho por causa do infame nome. Convenhamos que não é todos os dias que se pode ver escrito, com creme de chocolate num bolo de aniversário, a dedicatória "Happy Birthday Adolf Hilter!". O pudor, a dignidade intelectual e o respeito pela memória de 6 milhões de judeus mortos no Holocausto terão pesado na consciência do pasteleiro e, consequentemente, na nega ao pedido.
Há estigmas e estigmas na vida. Mas o estigma que esta pobre criança, Adolf Hitler Campbell, vai carregar às costas até morrer, é daqueles estigmas que nem Jesus Cristo conseguiria suportar. Ele há coisas...
Heath Campbell com a filha JoyceLynn Aryan Nation Campbell.