quinta-feira, 31 de janeiro de 2008

Discos que mudam uma vida - 10


Einstürzende Neubauten - "Halber Mensch" (1985)

Vender música para publicidade


Será apenas a compensação fincanceira que leva músicos a ceder as suas composições a campanhas publicitárias na televisão? É a única razão que me parece plausível, uma vez que não julgo que acreditem que a publicidade a um banco ou a um detergente contribua para que a música seja mais conhecida. Pelo contrário: pode ser contraproducente. Apesar de ser uma opção consciente e legítima, um músico vender as suas obras para publicidade acaba sempre por ter efeitos perniciosos, mais cedo ou mais tarde. Com a política tão agressiva e massiva que os publicitários imprimem aos spots, a música que lhes está associada acaba por ter efeitos nefastos para o músico. Foi o que aconteceu com Pedro Abrunhosa e Sara Tavares, cujas músicas para uma instituição bancária se tornaram insuportáveis de ouvir de tanto passarem insistentemente na televisão. E é o que está a acontecer neste momento com uma das canções mais conhecidas de David Fonseca (para outro Banco, está claro). Aquela melodia assobiada já não se aguenta. À hora de almoço, no intervalo publicitário do noticiário a SIC transmitiu 4 vezes esse anúncio com o irritante assobio do ex- Silence 4. Quantro vezes no espaço de 10 minutos. É dose cavalar a mais para bagagem média do espectador (a exposição mediática excessiva acaba por matar a integridade do artista). E tirando a carteira do músico, o resto é alvo de um grande desgaste: a imagem pública do cantor e a sua música. Mas há artistas e artistas: por mais que o tentem com cachets milionários, Tom Waits não cede as suas músicas para publicidade. Aconteceu uma vez que uma marca de automóveis usou, sem autorização, uma composição de Waits. Não tardou a que o cantor ganhasse em tribunal uma indemnização pela infame ousadia.

Uma questão de bigodes


Quais são as novas tendências da moda? Uma peça de vestuário de um estilista consagrado? Um acessório fashion? Um penteado moderno? Não. A nova tendência da moda é... o bigode. É o que dizem os especialistas. Tanto assim é que até foi criado o Instituto Americano do Bigode em 2006 para recuperar esta tendência capilar no homem (e nalgumas mulheres, sejamos honestos). Como Portugal acompanha sempre as tendências da moda, por cá proliferam vários concursos anuais de bigodes (como o de Gouveia), com homens garbosos que ostentam frondosas pelugens no rosto. Tradição é tradição. E o bigode português é uma tradição. Alguém imagina um polícia português (agora menos, mas houve tempos...) sem barriga proeminente e sem um autoritário bigode? Já repararam que sempre que o Gato Fedorento (sobretudo o Ricardo Araújo Pereira) quer satirizar o português pacóvio ou saloio , o bigode é adereço certo?
A revista Sábado traz uma reportagem sobre a instituição do bigode e refere que há cada vez mais figuras públicas que usam bigode. Está na moda, outra vez. Mas o que é que isso interessa? Não interessa grande coisa, na verdade. Todo este falatório barato para dizer que esta história do bigode me faz lembrar duas coisas (estas sim interessantes): o escritor e dramaturgo italiano Luigi Pirandello e o realizador francês Emmanuel Carrère. Explico: Pirandello, Nobel da Literatura, escreveu um romance chamado "Um, Ninguém e Cem Mil". É a história irónica e trágico-cómica de Vitangelo Moscarda, pai de família e banqueiro influente, que repara um dia que o seu nariz é ligeiramente torto, pendendo para o lado direito. Esta simples constatação sobre uma pequena imperfeição da sua anatomia, leva o personagem aos limites da obsessão, com comportamentos cada vez mais estranhos e levando-o progressivamente à loucura e à quase bancarrota financeira.
O segundo exemplo é o de um filme chamado "La Moustache" (na imagem), com o subtil título português "Amor Suspeito", realizado por Emmanuel Carrère. Neste filme, ocorre que um dia, um homem pensa que vai fazer feliz a esposa e os amigos por rapar o bigode que usava há dez anos. Mas ninguém repara ou, ainda pior, toda a gente faz de conta que não repara. Toda a gente lhe diz que nunca usou bigode? Estará louco? Num caso e noutro (Pirandello e Carrère), assistimos a um fenómeno intrigante quanto curioso: um factor aparentemente banal e insuspeito pode desencadear um conjunto incontrolável de situações (nem sempre benéficas, quase sempre nefastas) na vida de alguém. No primeiro era um nariz ligeiramente torto, no segundo, fazendo jus à introdução deste post, era um bigode. Pormenores que obrigam a uma reflexão sobre a identidade, sobre aquilo que pensamos de nós próprios e o que os outros pensam de nós. Afinal, um bigode, um nariz torto ou até um dente podre contribuem decisivamente para a reflexão interior e para questionar o nosso relacionamento com os outros. E até com a Divindade. Não era Woody Allen que perguntava como poderia Deus existir se existe no mundo sofrimento, pobreza e calvície?

Orgia... literária


Há orgias e orgias. E há orgias literárias. A Orgia Literária é um site feito por várias pessoas que têm em comum o amor pelos livros - que é, provavelmente, o melhor ponto de partida para quem quer falar sobre eles. Para além de artigos sobre livros e literatura, há recensões críticas e entrevistas (muito) interessantes, como a do Gonçalo M. Taveres (na foto). Entremos na orgia.

quarta-feira, 30 de janeiro de 2008

Cinecitta - souvenirs cinéfilos

Para os indefectíveis da cultura pop em geral e do cinema em particular, nada melhor do que consultar a loja Cinecitta. Aqui vendem-se DVD de importação (filmes raros ou malditos), t-shirts de filmes e realizadores, bonecos, posters, postais e uma infinidade de objectos alusivos à 7ª arte. Vale a pena espreitar.
Já encomendei esta t-shirt:

Tamanho S.

Manuel João Vieira Catita

"Um Mundo Catita" é um filme sobre Manuel João Vieira - músico dos incontornáveis Ena Pá 2000 e Irmãos Catita. Que mais há a dizer? Que o trailer está realmente apetitoso e catita. E que o homem já merecia um filme. Oh se merecia!

Johnny Guitar x 65



Um dia um jornalista perguntou ao João Bénard da Costa qual o filme da sua vida. Ele que editara um livro magistral sobre "Os Filmes da Minha Vida". O director da Cinemateca Portuguesa respondeu num ápice: "Johnny Guitar" (1954) de Nicholas Ray. E para reforçar o seu amor pelo filme, insiste: "ao longo da minha vida vi-o 65 vezes". Cinquenta e cinco vezes que viu o mesmo filme! Mesmo vindo de um cinéfilo à moda antiga, não deixa de ser, aos olhos comuns, uma certa manifestação patológica por um objecto cultural. Como se explica? Provavelmente, da mesma forma como se explica que se ouça uma música dezenas, centenas ou milhares de vezes sem que o cansaço ataque o nosso espírito. É certo que a música e o cinema são duas linguagens estéticas diferentes e a sua fruição é, também ela, feita de forma diferente, mas não deixa de haver paralelismos. Se retiramos prazer auditivo quando ouvimos à saciedade uma música, porque não há-de alguém retirar prazer audiovisual (ou de outra ordem) de um filme?
Seja como for, o caso do João Bénard da Costa não deixa de ser invulgar. No meu caso, é verdade que há filmes que revejo e revejo e que não me cansam, enquanto outros me causam náuseas logo no primeiro visionamento (aconteceu-me há dias com o inenarrável "Mr. and Mrs. Smith). Mas não sei se algum dia conseguirei visionar 40, 50 ou 65 vezes o "Vertigo" ou "Sede de Mal". É que também há limites para o prazer estético.

Fumar e Não Fumar

É um filme aconselhável a fumadores e a não fumadores. Mas tratando-se de um filme de Alain Resnais, é muito mais do que isso: "Smoking/No Smoking" (1993) é um díptico (filme em duas partes) fascinante sobre uma mesma história, um mesmo cenário, os mesmos personagens, os mesmos intérpretes. Só que tudo muda em virtude de um personagem fumar ou não. Simples? Não. Viciante como o tabaco.

Número redondo


Um número redondo dá sempre nas vistas. Este poiso chegou às 5 mil visitas. Em dois meses não sei se é muito, pouco ou nada. Mas isso não interessa. O que interessa é que este espaço continue a servir de território de liberdade opinativa, de partilha contínua de saberes e ideias. Para mim e para todos os outros. Até já!

terça-feira, 29 de janeiro de 2008

É a cultura, estúpido!


Este senhor é o novo Ministro da Cultura. Sociedades económicas, Direito Comercial, actividade bancária, Organização do Poder Judicial, assessoria jurídica são assuntos dos quais o novo senhor Ministro é perito. José Sócrates lá saberá porque é que António Pinto Ribeiro tem as qualificações, experiência, conhecimentos e perfil para ocupar a pasta da Cultura deste país. Ah, já descortinei! No seu currículo consta também: "é actualmente Administrador da PT Multimédia, S.A. e da Fundação de Arte Moderna e Contemporânea-Colecção Berardo." Assim sim.

Keith Haring


Keith Haring morreu cedo demais (morreu de SIDA aos 31 anos de idade). Haring é o criador de uma das mais notáveis e emblemáticas iconografias modernas, com o seu traço característico, os seus desenhos e graffitis de homenzinhos eléctricos. Keith Haring começou a ganhar notoriedade ao desenhar a giz nas estações de metro de Nova Iorque. Nos anos 80 participou em diversas bienais e pintou murais, de Sidney a Amesterdão e mesmo no Muro de Berlim. A sua arte é a de um artista iconoclasta, que seguiu um caminho estético próprio, alheio a modas e paradigmas. Da mesma forma que Basquiat (jovem artista protegido de Andy Warhol), Keith Haring abriu novas portas de entendimento de arte urbana. A sua linguagem influenciou grande parte da cultura pop actual e o seu legado continua a fascinar 8coisa rara) tanto crianças como adultos, tanto leigos como entendidos nos negócios da arte. De resto, Haring definiu toda a sua criatividade numa única frase: " don't think art is propaganda; it should be something that liberates the soul, provokes the imagination and encourages people to go further. It celebrates humanity instead of manipulating it":

segunda-feira, 28 de janeiro de 2008

Sound & Vision, Sound Art

Dois livros, duas obras fascinantes para compreender toda a complexidade do fenómeno musical contemporâneo. São livros editados muito recentemente (há poucos meses) no mercado internacional (na Fnac só por importação) e estão disponíveis através de venda directa na Amazon inglesa. "Sound & Vision", escrito a meias pelos italianos Luca Beatrice e Alberto Campo, renova a análise às tendências actuais da cultura audiovisual, fazendo o cruzamento entre as artes visuais e as manifestações sonoras (o livro tanto aborda Keith Haring como Mathew Barney, Chris Cunningham - a imagem da capa é retirada do videocplip "Come to Daddy" -, Aphex Twin ou Björk. Quanto ao segundo livro, com o sugestivo título "Sound Art - Beyond Music, Between Categories", do músico e escritor Alan Licht, propõe uma séria e aprofundada reflexão sobre o som enquanto arte, numa perspectiva histórica evolutiva. Partindo do Futurismo de Marinetti e Russolo, até ao minimalismo de LaMonte Young, às diabruras noise dos Sonic Youth ou ao malabarismo de discos de Christian Marclay, "Sound Art" é um livro essencial para os melómanos e curiosos na história das artes audiovisuais do Século XX e XXI. Além disso, esta obra conta ainda com um prefácio do músico Jim O'Rourke. Dois livros que se complementam para um melhor entendimento das estéticas e tendências artísticas audiovisuais contemporâneas.

Graeme Revell e a música dos insectos


Nasceu na Nova Zelândia, formou-se em Ciência Política e Economia. No entanto, foi (é) na música que tem dado cartas. Formou em 1978 um dos grupos de rock industrial mais corrosivos de sempre, SPK (Surgical Penis Klinik), projecto no qual tocava teclados e percussão. Graeme Revell enveredou depois por uma sólida e promissora carreira a solo. Pesquisador insaciável de nova fórmulas estéticas, Revell lançou um disco em 1986 que marcou a música daquela década - "The Insects Musicians". Um espantoso álbum no qual Graeme Revell gravou sons reais dos mais variados insectos para depois os manipular em estúdio. O resultado é um belo e único disco de exploração sonora, de beleza mágica, ritualístico, de contornos ambientais em que os cantos dos insectos (e por inerência, da natureza) deixam o ouvinte em estado quase catártico.
Três anos depois, o realizador australiano Philip Noyce convida Revell para compor a banda sonora do notável thriller "Calma de Morte" (1989), que tinha como estreante uma actriz chamada Nicole Kidman. Esse filme constituiu um grande êxito de crítica e de público, sendo que a música sombria e tenebrosa de Graeme contribuiu claramente para o grande impacto psicológico do filme. A partir desta experiência, o ex-SPK construiu uma sólida carreira como compositor de música para filmes, desde grandes produções de Hollywoodaté pequenos filmes independentes. Tem já dezenas de bandas sonoras originais para filmes, mas em muitos deles cedeu à componente comercial das produções e o risco estético que sempre o caracterizou desapareceu. Ver aqui a extensa lista de música que Graeme Revell compôs.

Norah Jones vs.ignorância

A cantora Norah Jones, filha do indiano Ravi Shankar, irmã de Anoushka Shankar, continua a surpreender nas lides artísticas. Depois de colaborar com o mestre das bizarrias sonoras Mike Patton no projecto Peeping Tom, Jones interpreta o papel feminino principal no filme "O Sabor do Amor" do chinês Wong Kar-Wai, com estreia nacional marcada para 1 de Maio. Nesse filme contracena com figuras de proa do cijema mundial como Jude Law (com quem tem tórridas cenas), Rachel Weisz e Natalie Portman. Na entrevista que concede à revista BLITZ, Norah Jones, a propósito da sua relação com o cinema do cineasta de "Chungking Express", diz esta frase lapidar: "nunca tinha visto nenhum dos filmes do Wong Kar-Wai: tão estúpida e ignorante que eu era". Fica sempre bem a uma estrela pop admitir estas coisas publicamente.

Amazon e os críticos amadores


Para quem faz compras de produtos culturais na Internet (e não só culturais), sabe que a Amazon (mais a americana que a britânica) é uma tentação inexcedível. É um mundo quase infindável de propostas e por lá podemos encontrar aquele livro especializado ou aquele filme em DVD refundido que só alguns eleitos conhecem. É normal que na Amazon existam comentários aos produtos, sobretudo livros, música e filmes. São comentários críticos de simples consumidores culturais que deixam as suas impressões relativamente a determinado objecto cultural. O certo é que alguns "críticos amadores" se tornam mini-estrelas na comunidade virtual. Um artigo da revista Slate Magazine dá vários exemplos, entre os quais se destaca a crítica classificada no primeiro lugar do "ranking" da Amazon - a extraordinariamente produtiva Harriet Klausner, que faz recensões de livros. Repare-se porquê: Klausner já tem publicadas mais de 15 mil recensões (!), o que equivale a um ritmo de 45 livros por semana (!!). Realidade ou ficção? A ser (minimamente verdade), é o que se chama de "exemplo exacerbado" de leitura para quem não costuma ler nada.

Discos que mudam uma vida - 9


Joy Division - "Closer"

domingo, 27 de janeiro de 2008

Clean Feed - o trabalho reconhecido


Primeiro foi a eleição da livraria Lello, no Porto, como a terceira mais bela do mundo pelo jornal The Guardian. Agora, o jornal All About Jazz, na sua edição de Nova Iorque, escolheu a editora portuguesa Clean Feed como uma das cinco melhores editoras de jazz do mundo. O extraordinário trabalho de divulgação do bom jazz nacional e internacional feito por esta editora (basta ver o catálogo para constatar a qualidade das edições), mereceu o aplauso dos especialistas mundiais. Na foto, o grupo português Lisbon Improvisation Players.
Parabéns.

The White Stripes - ritmo das imagens

Um dos melhores videoclips realizados por Michel Gondry (simplicidade com eficientes efeitos visuais sincronizados com o ritmo):

sábado, 26 de janeiro de 2008

Dois filmes iguais para quê?

O que diferencia estes dois cartazes de cinema? Para além do óbvio grafismo ser diferente, pouco. O primeiro cartaz refere-se ao filme "Funny Games" (1997) do austríaco Michael Haneke. O segundo cartaz é o remake do primeiro realizado por... Michael Haneke. Confuso? Não admira. O primeiro filme foi rodado com elenco austríaco e constituiu a rampa de lançamento para a brilhante carreira de Haneke na Europa. O segundo é um remake, idêntico plano a plano, do original, mas com actores americanos (com as estrelas Naomi Watts e Tim Roth) e vocacionado para o mercado americano. "Funny Games" é um filme controverso e violento, uma espécie de súmula de "Laranja Mecânica" (Kubrick) e "Cães de Palha" (Peckinpah). Haneke força o espectador a uma reflexão incómoda sobre o papel da violência na sociedade moderna, numa simples história que se conta numa frase: dois psicopatas invadem a casa de uma família em férias, sequestrando-os e forçando-os a participar em sádicos jogos de tortura (física e psicológica) e de morte. Mas é um trabalho que não faz a apologia da violência gratuita, é antes um perturbante estudo psicológico sobre a violência mediatizada (os assassinos usam o vídeo para gravar os actos) e a agressividade extrema sem justificação ou motivação aparentes.
Ora, Michael Haneke fez um remake do seu próprio filme para estrear nos EUA em Março próximo. A pergunta que se impõe é: porquê? Para quê? O filme original é suficientemente bom, é redundante fazer um remake só porque tem actores comerciais. Por questões económicas? Não se percebe. Faz lembrar o inútil remake de "Psycho" de Hitchcock feito por Gus Van Sant em 1998. Esperemos para ver esta versão de Haneke para avaliar se a empreitada valeu a pena. Ah, pelos vistos, esta versão de 2008 tem... três planos adicionais em relação ao filme orignal. Assim já deve valer a pena ver o remake.

Uma questão de fé


"Sou ateu graças a Deus"- Luís Buñuel

sexta-feira, 25 de janeiro de 2008

Emmanuel Nunes ou Leonel Nunes?


O compositor português Emmanuel Nunes vai estrear no Teatro Nacional São Carlos, a sua primeira e muito aguardada ópera, “Das Märchen”, baseado num texto de Goethe. Emmanuel é um caso paradigmático da música erudita de vanguarda. Herdeiro da estética da electro-acústica de um Stockhausen, Emmanuel Nunes é um compositor que explora a inovação trilhando novos universos sonoros. É assim? Para uns é, para outros não. O jornal Público de hoje relata que Nunes é tudo menos um músico consensual, uma vez que há quem defenda a sua originalidade, e há quem simplesmente classifique o seu trabalho como “execrável e horrenda”. O compositor e maestro Alexandre Delgado tem a coragem de afrontar a suposta genialidade de Nunes, ao dizer até que vai querer estar a quilómetros de distância do São Carlos esta noite e que preferia ouvir música pimba do que a música conceptual de Nunes. Daquilo que conheço de Emmanuel Nunes gostei, não é uma música nitidamente fácil, é complexa e conceptual, mas não deixa de ser desafiadora intelectualmente (é essa uma das grandes críticas feitas à música erudita de vanguarda: falta emoção o que sobra em conceptualismo).
Com a reacção de Alexandre Delgado, importa agora perguntar: Quem é mais interessante: Emmanuel Nunes ou Leonel Nunes?

Que filme vamos ver?


Esta semana estreiam nas salas de cinema portuguesas, nada mais, nada menos do que sete filmes. Num país como Portugal, onde os hábitos de ir ao cinema descem de ano para ano (como no resto do mundo), como é possível que haja esta avalanche de filmes numa só semana? Perante este panorama, não admira que haja filmes que sejam retirados de cartaz ao fim de uma semana. Não admira que o público fique baralhado no momento de optar por um ou outro filme. Não admira que o cinema continue na crise em que está. Claro que o excesso de oferta só tende a estrangular a procura.

quinta-feira, 24 de janeiro de 2008

Bukowski


Bukowski, Charles Bukowski.
No seu túmulo lê-se um desconcertante epitáfio: “Don’t Try”. Foi um poeta e romancista maldito, um vagabundo genial à mercê das piores intempéries da vida. E a sua vida - repleta de deboche e escândalos - dava um belo filme realizado por um Jim Jarmusch. Eis que descobri um site brasileiro com imensa informação sobre o autor de “Mulheres”. Citações sobre tudo e mais alguma coisa: cinema, violência, música pop, trivialidades, artes... Era um caso o Bukowski. Um caso sério de literatura que hoje se tornou raro. Aqui.

Filmes e lavagem ao cérebro


Francis F. Coppola sempre se assumiu, ao longo da carreira, como um orgulhoso outsider face ao sistema de Hollywood. Mesmo quando esse sistema lhe financiou alguns dos seus filmes. Por isso criou a sua própria produtora independente Zoetrope, ainda que tenha ido à falência após o fracasso comercial (mas não artístico) decorrente do filme “Do Fundo do Coração”. Agora o autor de “Rumble Fish” deu mais uma aferroada ao dizer que Hollywood não tem feito mais do que uma “lavagem cerebral” aos espectadores, com filmes que são todos idênticos, que não ousam nem arriscam. Tirando algum exagero nesta crítica, Coppola não deixa de mexer na ferida com o que Coppola diz. Aliás, "lavagem cerebral no cinema" seria um promissor e profícuo tema para um dissertação académica.

Para algo completamente difícil


Qual é o rei da comédia burlesca do período mudo?

1 - Charlie Chaplin
2 - Buster Keaton
3 - Harold Lloyd

Começo eu: hum, errr, ughh... Charlie Chaplin! (Keaton que me perdoe...)

Uma questão de pontuação

Evidência clara: a pontuação numa frase é determinante, como se comprova no exemplo a seguir. O poder subestimado de uma vírgula é capaz de alterar o sentido a uma frase. Não sei é se as diferenças de pontuação efectuadas por homens e mulheres se deveram a mero exercício linguístico ou se houve preconceitos feministas e machistas por trás.

quarta-feira, 23 de janeiro de 2008

A idade de ouro da TVE

A televisão espanhola teve um programa no canal TVE2 absolutamente pioneiro na divulgação musical de tendências alternativas. E não foi há 1 ano ou há 5, mas sim há 25 anos atrás. Chamava-se "La Edad de Oro" (referência óbvia ao filme homónimo de Luís Buñuel) e tinha como apresentadora uma jornalista com basta cabeleira e com o curioso nome de Paloma Chamorro. Esta jornalista estava ligada ao movimento punk e à célebre movida madrileña. Estávamos em 1983 (o programa durou apenas dois anos mas deixou profundas marcas numa geração) e o programa era um autêntico baluarte de divulgação musical conotada com a vanguarda (na pop como no rock, na experimental ou na electrónica). Pelo estúdio de televisão da TVE2 passaram muitos grupos e músicos (tocando ao vivo), espanhóis e estrangeiros, que fizeram história no panorama musical da década de 80. Concertos e entrevistas aos artistas eram as principais coordenadas orientadoras do programa. Paloma Chamorro sabia do que falava (às vezes falava demasiado) e estava atenta ao que de mais excitante se passava na música desses anos. Prova disso são as passagens pelo "La Edad de Oro" de grupos como The Sound, SPK, Test Department, Violent Femmes ou Bauhaus. Ora, com a facilidade do YouTube podemos desenterrar algumas preciosidades. Como é o caso desta entrevista aos míticos The Residents, grupo americano responsável por algumas das maiores ousadias estéticas dos últimos 30 anos. Nesta sequência, para além de uma introdução muito bem documentada de Paloma, podemos ver o trio de músicos anónimos com as habituais máscaras dos olhos com chapéu, seguido de performance.
A minha dúvida é: apesar de vivermos em 2008, seria possível voltar a haver um programa de divulgação musical com estas características? Julgo claramente que não.

Edmond - o pecado de existir


O que acontece quando uma cartomante nos diz: "você não pertence a esta vida." O protagonista deste filme, um vulgar homem de negócios com uma vida entediante, de seu nome Edmond, dá uma resposta possível: chega a casa, diz à mulher que vai sair para não mais voltar. E assim faz. Começa a deambular pelas ruas de Nova Iorque, cheias de tentações e perigos ao virar da esquina. Edmond empreende uma viagem existencial à procura de um sentido de libertação espiritual, à procura de sensações de energia e adrenalina que o façam sentir... vivo. Sexo, crime, violência, desespero, descontrolo emocional - um calvário terreno até à expiação dos pecados finais. Ecoam por esta película uma simbiose de laivos de "Fight Club" ou de "Eyes Wide Shut". É como se Edmond se culpasse por viver uma vida vazia, absorta, ausente. Edmond é interpretado pelo excelente actor William H. Macy. Aliás, todo o filme é suportado pela performance de Macy.
"Edmond" é um filme que passou completamente ao lado do panorama cinematográfico de Portugal (nem teve estreia nacional), mas agora que chegou aos videoclubes e se encontra à venda em DVD, vale a pena conhecê-lo. Fez furor quando, há dois anos, passou pelo festival de Sundance. O realizador Stuart Gordon - conhecido sobretudo pelo truculento filme de terror gore "Re-Animator" (1985) -, faz par com o notável argumentista e realizador David Mamet. Mamet sabe como ninguém contar uma história, e uma história quase sempre com contornos que desafiam a lógica narrativa habitual, com elementos assaz surrealistas e muito bem engendrados. Nota-se a cada passo que a escrita é de Mamet, nos diálogos, nas situações narrativas criadas, no subtil humor, nas personagens no limite do abismo, nas piscadelas de olho ao espectador. Veja-se este diálogo:
Glenna: You know who I hate?
Edmond: No, who is that?
Glenna: Faggots.
Edmond: Yes, I hate them too. Do you know why?
Glenna: Why?
Edmond: They suck cock. And that's the truest thing you will ever hear.

Cicatrizes e segredos do amor


"Children show scars like medals. Lovers use them as secrets to reveal. A scar is what happens when the word is made flesh."
Leonard Cohen

terça-feira, 22 de janeiro de 2008

Uma petição para vir a Portugal?

A revista Uncut revela que este cantor e compositor se prepara para uma digressão europeia. Fantástica notícia. Será preciso uma petição na Assembleia da República para o trazer a este rectângulozinho?

Livros que mudam uma vida - 4


"O Coração das Trevas" - Joseph Conrad
É mais conhecido pelo facto de Francis Coppola ter baseado o seu "Apocalypse Now" nesta obra. Mas o livro de Joseph Conrad vale por si próprio. Um espantoso relato sobre os limites do que é humano.

Live fast, die young


Há 15 dias foi a morte prematura do actor Brad Renfro, com apenas 25 anos de idade. Hoje o mundo é surpreendido com a morte súbita de Heath Ledger, actor em clara ascensão depois do monumental sucesso de "Brokeback Mountain" (tinha acabado de finalizar o último capítulo de Batman no papel de Joker) e, imagine-se, estava a filmar com um dos elementos dos Monty Python, Terry Gilliam, no filme "The Imaginarium of Doctor Parnassus" (a estrear em 2009). Ambos foram encontrados mortos nos apartamentos - um em Los Angeles (Renfro), outro em pleno centro de Nova Iorque (Ledger). Ambas causas de morte estão relacionadas com o excesso de drogas e álcool. O mítico paradigma da cultura juvenil iniciado com James Dean (live fast, die young) e continuado com Jimi Hendrix, Jim Morrison, Janis Joplin, Ian Curtis, River Phoenix ou Kurt Cobain (todos morreram antes dos 30 anos) voltou a sacudir as cabeças das estrelas pop?

Corrida à estatueta dourada


Apesar de não estar totalmente garantida a próxima cerimónia dos Óscares, a academia resolveu arriscar e, tal como acontecera com os Globos de Ouro, houve uma morna cerimónia para anunciar os nomeados às estatuetas douradas. Sem querer fazer uma análise exaustiva (até porque não vi grande parte dos filmes - os preferidos vão estrear em Portugal brevemente), queria realçar dois aspectos invulgares nas nomeações: - o facto dos principais filmes nomeados (com 8 nomeações) serem da autoria não de realizadores tarefeiros e comerciais, mas sim de dois verdadeiros "autores": Paul Thomas Anderson com "Haverá Sangue" e Joel e Ethan Coen com "Este País Não é Para Velhos". É um sinal de que a Academia, finalmente, coloca de parte os blockbusters em favor de cineastas de culto. Coisa inédita. O aspecto a realçar é a fortíssima concorrência para a vitória na categoria de Melhor Interpretação Masculina. São cinco notáveis actores em cinco filmes que, dizem lá fora, são extraordinários: Viggo Mortensen, Tommy Lee Jones, Johnny Depp, Daniel Day-Lewis e George Clooney. Destes actores, ainda só vi a portentosa interpretação de Mortensen no filme de Cronenberg. Certamente que as apostas vão estar ao rubro.

Para um novo conceito de diversão nocturna


Há uns dias a SIC mostrou uma reportagem sobre as novas formas de diversão nocturna em Lisboa. O Bairro Alto continua em alta, como sempre, mas há franjas de público que procura espaços de convívio alternativos que estejam aliados à fruição cultural. Espaços que fogem ao circuito habitual de bares e que propõem concertos, tertúlias, exposições, leituras de poesia, performances. Exemplo do sucesso desta tipologia de espaço é a Fábrica de Braço de Prata (no Paço do Bispo), um espaço com uma livraria, 12 salas e 3 ateliers (foto). Trata-se de uma antiga fábrica recuperada com o intuito de proporcionar experiências culturais diferentes, não institucionais e de carácter quase espontâneo. A Fábrica de Braço de Prata é um projecto conjunto das livrarias Eterno Retorno e Ler Devagar. Para marcar posição e fidelizar o público, maioritariamente universitário e jovens artistas, a Fábrica dinamiza uma programação cultural exigente e rigorosa (conferências, leituras, cinema, música). A SIC revelava ainda que, à semelhança da Fábrica de Braço de Prata, outros espaços alternativos florescem em Lisboa vocacionados para um determinado segmento de público, para a divulgação de um dado género musical ou corrente artística.
Complementarmente à reportagem televisiva, este último Sábado podia ler-se no semanário Expresso uma reportagem sobre o crescente aparecimento de novos cafés lisboetas que exploram esse conceito, marcadamente urbano e cosmopolita, de conciliar a exploração de um espaço diferente (uma antiga casa ou fábrica) com uma preocupação de promoção cultural raramente vista nos anos anteriores (a Galeria Zé dos Bois foi a precursora deste fenómeno). São cafés que renovam o prazer da tertúlia, do reencontro de pessoas para a conversa cultural, para o debate de ideias ao som de música jazz, improvisada, ou enquanto se ouve um recital de poesia ou se frui uma exposição de arte contemporânea. Este e outros exemplos revelam a sedimentação de um novo conceito para a diversão nocturna aliada à dinamização cultural. É de louvar registar esta nova perspectiva de bares e cafés, contrariando a imagem conservadora, amorfa e uniformizada deste tipo de espaço.

segunda-feira, 21 de janeiro de 2008

O cantor de jazz tem 81 anos


Hoje, dia 21 de Janeiro, assinalam-se 81 anos desde a apresentação do primeiro filme sonoro da história do cinema: "The Jazz Singer" ("O Cantor de Jazz") de Alan Crosland. Foi em 21 de Janeiro de 1927 que a revolução do sonoro teve início. Foi um dos primeiros filmes a ganhar o Óscar, repartindo o mesmo com o magnífico filme "O Circo" de Charlie Chaplin. Al Jolson fazia de cantor negro de jazz (na realidade era branco) e o filme, sem ser uma obra-prima, é sobretudo lembrado pela inovação técnica do som ser registado na película.

Oliver Stone vs. George Bush


Oliver Stone tem sido um realizador profundamente comprometido com as causas políticas. Como ex-combatente do Vietnam, Stone tem certamente uma sensibilidade social e política muito própria. Dessa consciência resultaram filmes em discurso directo como "Platoon", "Nascido a 4 de Julho", "Salvador", "JFK", "Nixon", "Comandante" (sobre Fidel Castro) ou "WorldTrade Center". Todos estes filmes são, cada um à sua maneira, postos de observação crítica perante a sociedade americana, os políticos carismáticos do mundo e os conflitos da América (os interiores e os exteriores). Hoje é notícia que Oliver Stone se prepara para realizar um filme sobre... George W. Bush. Outra vez a veia política a vir ao de cima na carreira de Stone. O filme irá estrear, imagine-se, em Novembro próximo, mesmo a tempo de coincidir com as eleições norte-americanas. Será a figura de Bush assim tão interessante para fazer um filme? O que pretenderá Stone com este projecto? Denunciar a política republicana na Casa Branca e ajudar os democratas na eleição? Oliver Stone promete abordar de forma "justa" a vida e carreira política de Bush. Falta saber o que entende por "justo" o realizador. Oliver Stone é um realizador político muito astuto e talentoso ("JFK" ou "Nixon"são exemplos disso), daí que este seu próximo filme suscite muito interesse e expectativa.

domingo, 20 de janeiro de 2008

Uma livraria que orgulha o país


A notícia já tem alguns dias, mas nem por isso deixa de ser marcante: o respeitável jornal The Guardian elegeu a Livraria Lello no Porto como a" terceira mais bela do mundo". Repare-se: a terceira mais bela... do mundo. Mais: contando que as outras duas livrarias que ficaram em 1º e 2º lugares são espaços recuperados (como igrejas que se tornaram livrarias), é o mesmo que dizer que a Lello é a mais bela livraria do Mundo construída de raiz. É obra. É um prémio merecido para um espaço com identidade dedicado à cultura e ao conhecimento. E é uma forte estocada para os velhos do restelo que vociferam máximas gastas como "lá fora é que é bom!". Vê-se.

sábado, 19 de janeiro de 2008

Tanto para fazer antes de morrer


As edições livreiras têm inundado o mercado com livros (melhor: manuais quase bíblicos) sobre o que devemos ouvir, ler, ver e conhecer antes de morrer. E os editores não fazem a coisa por menos - são sempre 1001 títulos para conhecer, nunca 100 essenciais ou 500. 1001 e pronto. Em comum, estes livros têm duas obsessões: indiciar mais de mil títulos e a morte. Ler, ver, ouvir, tudo antes de morrer. Porque podemos morrer hoje ou amanhã. Há qualquer coisa de exacerbado nestes livros, e o excesso de consumo cultural pode revelar-se contraproducente. Ora, isto é demasiada cultura para uma vida média de alguém. Se quisesse conhecer todos os livros, filmes, discos e lugares propostos nestas enciclopédias, teria de me dedicar o resto da vida a não fazer mais nada para além de ler, ver filmes, ouvir música e visitar os lugares propostos. Isto implicaria disponibilidade total e muito dinheiro (para viajar).
Mas, quem sabe?...

Saga Corleone em versão explosiva

Ainda a propósito do post sobre o filme “O Padrinho”, não posso resistir à tentação de colocar a versão neurótica (mas muito criativa) do grupo Fantômas (de Mike Patton) inserida no álbum “The Director’s Cut”, dedicado a versões de músicas de filmes. O que os Fantômas fazem é recriar o mítico tema da saga de Coppola e contrabalançar o lado violento e com o lado lírico e poético da trilogia. Alguém se deu ao trabalho de fazer uma montagem caseira fazendo coincidir as imagens com a música e a colocou no YouTube. O resultado é, literalmente, explosivo:

Discos que mudam uma vida - 8


Tom Waits - "Swordfishtrombones"(1983)

Xadrez mundial mais pobre



Leio que Bobby Fischer, um dos últimos grandes génios do xadrez mundial morreu. Um génio irreverente que tinha tanto de genial como de louco. A propósito de Fischer, já tinha falado da relação entre loucura e genialidade aqui.

Os rostos no cinema


Sobre os rostos no cinema haveria muito a dizer. Rostos femininos e masculinos. Desde que Carl Dreyer, no final do período mudo, filmou o rosto expressivo de Maria Falconetti (na foto) em grandes planos no filme "A Paixão de Joana D'Arc" (1928) que a imagem da mulher nunca mais voltou a ser a mesma. A seguir a Falconetti, muitas outras actrizes contribuíram para o glamour da sétima arte. De Greta Garbo a Marlene Dietrich, de Katherine Hepburn a Ingrid Bergman, de Sofia Loren a Charlize Theron, de Brigitte Bardot a Nicole Kidman. Na sequência que se segue, maravilhosamente montada, surgem dezenas de rostos de actrizes famosas pela fama, pelo talento, mas também pela incrível fotogenia e beleza plástica. São imagens de mulheres que fizeram a história do cinema desde o cinema mudo até aos nossos dias. Curiosamente, esse sofrido e expressivo rosto de Falconetti não surge contemplado nesta montagem. Falha grave.

sexta-feira, 18 de janeiro de 2008

O fim de Corleone

Apesar da má interpretação de Sofia Coppola, este é um dos melhores finais de filme dos últimos 20 anos. Refiro-me à sequência final do filme “O Padrinho 3” da saga “O Padrinho”. É um final espantoso de energia e emoção. Al Pacino ao seu melhor nível – o grito surdo (mas ensurdecedor) na escadaria após a morte da filha é arrebatador. A montagem seguinte com o momentos passados de felicidade, a belíssima banda sonora e, apogeu dos apogeus, o rosto de Michael Corleone decadente, velho e sozinho. O movimento lento e agonizante de colocar os óculos. E o plano final, com o mesmo Corleone sentado, um cão vagabundo a rodeá-lo, e a morte inadiável. O fim triste da família Corleone. Emocionante até às lágrimas, num filme que, quanto a mim, não desmerece em relação às obras-primas anteriores da trilogia.

Fotografias a rodos


Quantas vezes necessitamos de fotografias de qualidade para ilustrar um texto, um trabalho, um cartaz e não encontramos nada de interessante na Internet. Ou são imagens de má resolução, ou não se enquadram no tema que pretendemos, ou ainda, são imagens demasiado conhecidas e protegidas por direitos de autor. Pois bem, foi a pensar nestas necessidades que foi criado o site Morguefile, um extraordinário portefólio fotográfico ao serviço de toda a gente. Tem duas grandes vantagens: está isento de direitos de autor (apesar de todas terem o nome do autor da foto) e as fotografias indexadas têm grande qualidade em termos estéticos e de resolução (a maior parte são de fotógrafos profissionais ou de free-lancers). As fotos estão divididas nos temas mais distintos - neste arquivo - e apropriados para (quase) todas as situações. Dito por outras palavras, se alguém precisar de uma foto sobre flores, animais, pessoas, objectos, paisagens, máquinas, abstractas, do quotidiano, etc, vai ao Morguefile e certamente encontrará uma imagem de qualidade adequada ao desejo de cada um. É para o favoritos, já.

Graffiti & Duchamp


Quando estacionei o carro olhei para o muro da casa mesmo em frente fiquei surpreendido com o que vi. Nada mais nada menos do que uma reprodução perfeita em graffiti do "Urinol" (mais propriamente "Fonte") de Marcel Duchamp. Lembro que este ready-made do artista francês foi considerada a obra de arte mais influente do Século XX. O que quer dizer muita coisa. A minha surpresa deveu-se ao facto deste graffiti fugir ao paradigma habitual da arte graffiti. Estarão os graffiters com uma consciência artística mais aturada? Terão deixado para trás os ícones da cultura hip-hop e urbana para se dedicarem à exploração das referências da arte vanguardista?
E por falar em graffiters, vale a pena dar uma olhadela no surpreendente trabalho de um dos artistas de rua mais consagrados e originais (e anónimos) da última década - Banksy.

quinta-feira, 17 de janeiro de 2008

A vida é alegre?

Alegre? Demasiado alegre? Bem disposto? Maravilhado com a vida? Eu tenho o antídoto. Sinta os ruídos, a ambiência lúgubre e violenta, a voz cavernosa a gritar "A Morte é um dandy!" e tudo será diferente. A vida voltará a ser negra, envolta em nuvens espessas, o mundo será um eterno palco de sofrimento e dor.
Einstürzende Neubauten - "Der Tod ist eins Dandy"

A vida é triste?

Desanimado? Abatido? Deprimido? Tenho um antídoto. Veja este videoclip, sinta o beat, o fraseado melódico do trompete, frua a ambiência jazzy e a voz marcante. O sol voltará a brilhar. Sentimos que o mundo é perfeito, as flores crescem e o Benfica pode voltar a ser campeão.
E o hip-hop e o jazz (ou o jazz e o hip-hop) nunca mais voltaram a ser os mesmos.
Us3 - "Cantaloop"

Orlan - desafios do corpo


Quem é Orlan? Uma artista contemporânea que usa o seu corpo como superfície de criação estética. Não para alcançar um ideal de beleza (coisa que abomina), mas para testar os limites de expressividade do corpo humano na sociedade. Para tal tem submetido o seu corpo a intervenções cirúrgicas de forma a que este seja adulterado, explorado das mais diversas formas É uma abordagem artística diferente da de Stelarcaqui mencionada. Orlan é uma artista que usa a body art e a performance para se questionar sobre as fronteiras entre a vertente física do seu corpo e a sua possibilidade de superação. É excêntrica? Claro. Há algum artista contemporâneo que, para ter visibilidade e reconhecimento, não tenha que ser excêntrico?

A vida embriagada


"Devemos andar sempre bêbados. Tudo se resume nisto: é a única solução. Para não sentires o tremendo fardo do Tempo que te despedaça os ombros e te verga para a terra, deves embriagar-te sem cessar. Mas com quê? Com vinho, com poesia ou com virtude, a teu gosto. Mas embriaga-te. E se alguma vez, nos degraus de um palácio, sobre as verdes ervas duma vala, na solidão morna do teu quarto, tu acordares com a embriaguez já atenuada ou desaparecida, pergunta ao vento, à onda, à estrela, à ave, ao relógio, a tudo o que canta, a tudo o que fala, pergunta-lhes que horas são:«São horas de te embriagares! Para não seres como os escravos martirizados do Tempo, embriaga-te, embriaga-te sem cessar! Com vinho, com poesia, ou com virtude, a teu gosto.»
Charles Baudelaire - "Spleen de Paris"

Precocidade e os vícios


Haverá razões reais para os pais deste país de preocuparem ou trata-se apenas de vipes passageiros próprios da adolescência? Hum...

Não é só uma questão de estilo

Reparem qual a etiqueta deste post: "Arte e tecnologia". Não podia ser de outra forma. O novo MacBook é arte. E tecnologia. Muita. Não vai ser Natal brevemente?

Café e cigarro


Por agora o Estado ainda não proibiu o consumo de café. Mas não me admira que, nesta vertigem governamental de controlo obsessivo de vícios públicos, um dia chegue a hora em que isso aconteça. O que seria da vida sem café e sem cigarro? Mesmo para quem não fuma ou não bebe café, aceitará a ideia de que sem estas duas formas de consumo não se teria feito a história da humanidade da mesma forma durante o século XX. Não teria havido vida de café (espaço físico), nem vida boémia e artística. O cigarro e o café são, indubitavelmente, duas formas de prazer do homem e dois ícones da cultura popular. E se não fosse pelo cigarro e pelo café, não teria havido este belíssimo filme de Jim Jarmusch à volta de... cigarros e café. “Coffee and Cigarrettes” (2003) é uma espécie de apologia dos dois vícios como exercício de liberdade. Um filme minimalista e provocador: uma mesa de café, duas personagens, conversa fiada, e rios de café e nicotina. Com quem? Tom Waits, Iggy Pop, Bill Murray, Steve Buscemi, Steve Coogan e Cate Blanchett. E eu que não fumo (só bebo café) dá-me sempre vontade de saborear uma cigarrada depois de ver o filme.

quarta-feira, 16 de janeiro de 2008

Filmes - legendar ou não


Ao fazer zapping pelos canais de televisão, passei por um canal espanhol. Estava a passar o filme “Pearl Harbour”. O filme é dispensável (quanto a mim), mas nem foi isso que me chamou a atenção. A questão é que o filme era dobrado em castelhano, coisa a que já não estava acostumado há muitos anos. Devido ao facto de viver junto à fronteira espanhola, habituei-me quando era miúdo a ver filmes nos canais televisivos espanhóis, sobretudo aos sábados à tarde (grandes westerns eu vi pela primeira vez nessas sessões). Espanha possui, há muitos anos, uma verdadeira indústria de dobragem de filmes estrangeiros, com actores profissionais que se dedicam quase em exclusivo a este negócio (é uma arte, mas também um negócio). Os defensores das dobragens de filmes de língua estrangeira garantem que é uma forma de salvaguardar a língua e a cultura nacionais. É e não é.
A legendagem também promove o exercício da leitura e, acima de tudo, respeita a integridade artística inerente ao trabalho dos actores, dado que a voz de um actor representa um elemento preponderante, e por vezes essencial, da sua interpretação. Por outro lado, quando via filmes na televisão espanhola, era frequente conhecer as vozes dos actores espanhóis que dobravam estrelas de Hollywood. E não era raro deparar-me com um filme em que o mesmo actor que dobrava Marlon Brando, dobrava também Chuck Norris. Felizmente que em Portugal a legendagem vingou em detrimento da dobragem (esta só se aplica, e bem, a filmes infantis), fenómeno que já vem do tempo do Estado Novo (é estranho como Salazar não optou pela imposição da dobragem, já que era tão defensor dos valores conservadores da cultura nacional). Em Espanha a tradição dos filmes dobrados continua em força, mesmo nas estreias na sala de cinema – são poucos os filmes em exibição na versão original. A dobragem, por melhor que seja feita, acaba sempre por desvirtuar a arte da interpretação e torna-se irritante ver continuamente a dessincronia entre a expressão labial e a fala. Ao fim e ao cabo, será que tem o mesmo efeito ouvir Robert Duvall dizer no “Apocalypse Now” a célebre afirmação “You smell that? Napalm, son. Nothing else in the world smells like that. I love the smell of napalm in the morning” em inglês, em castelhano, em francês ou em mandarim?

Acumular até rebentar


O que fazer quando a parede do escritório destinada a arquivar os CDs e DVDs atinge o limite da capacidade? Passar para outra parede? Não, porque as outras estão igualmente repletas até ao tecto. Hum, há sempre a alternativa de arquivar DVDs e livros em prateleiras improvisadas feitas de tijolo aplicadas pelos corredores da casa. Quando era miúdo e coleccionava cassetes áudio, a minha avó perguntava-me atónita: “mas para que queres mais cassetes? Não te servem as que tens?” De facto, agora as mil e tal cassetes áudio acumulam-se e apodrecem num canto da garagem. Snif…
Há sempre a possibilidade de doação a uma instituição de beneficência, mas não sei se este tipo de instituição acharia piada aos meus gostos musicais e cinéfilos. A solução passa por acumular, atafulhar até que a coisa rebente por algum lado.